Tendo-se mergulhado até ao nariz no rio e ouvindo o embalo das algas, Chara fechou os olhos para escutar melhor. Ao fim de algum tempo pareceu-lhe ouvir vozes ao longe e concentrou-se.
“É como te digo. Eu não acredito nesse “mar” de que todos falam. Por mim, vou remar contra essa corrente e ver se descubro alguma coisa.”
“Mas tu estas doido, certamente” ouviu-se dizer outra voz. ” És um peixe! Porque haverias de fazer tal coisa?”
Chara percebeu por fim que dois peixes conversavam por baixo do seu nariz. Manteve-se imóvel mas nenhum deles pareceu reparar nela. Não era habitual ouvir peixes a falar e isso fê-la sentir-se confusa. Sorriu e voltou a fechar os olhos.
Quem falou foi a primeira voz.
“Como sabes que vamos para esse “mar” de que tanto falam?”
” Amigo, tu costumavas ser um tipo introspectivo…” disse o outro abanando a cabeça. “Não sei o que te aconteceu”
“Continuo à espera da minha resposta.”
“E porquê a pergunta?”
Disse o primeiro peixe – ” Decidi que não faz sentido continuar a nadar com a corrente para um lugar que nunca vi, “mar”! Pois se nem sei se existe. Nem tu sabes!”
“Não sei…mas acredito”
“Oh!” – disse trocista – Se eu acreditar que posso trepar uma árvore isso não faz de mim um esquilo! Ou faz?!”
O segundo peixe ficou em silêncio observando os bigodes a ondular. Por fim respondeu.
“Os peixes nadam com as correntes ou assim acho. E os rios vão dar ao mar, é como dizem! Se nadares contra a corrente vais ficar exausto e podes até perder-te e acabar num aquário se alguém te apanha!”
“Ha!”- o primeiro peixe disse trocista. ” Outro lugar do imaginário hídrico!”.
“Imaginando que tenhas razão…” começou o segundo – “O que esperas encontrar?”
“Absolutamente nada.”
O segundo peixe revirou os olhos. Parecia derrotado e sem argumentos. Por fim exclamou perdido – ” Um peixe que não quer ser peixe. Pois eu te digo que venhas comigo descobrir se o mar existe ou não. Se for uma fantasia estás sempre a tempo de seres esquilo…!”
“Oh mas enganas-te. Eu também não sei se esse “tempo” existe…”